domingo, 19 de janeiro de 2014

Entrevista com a psicanalista Silvia Herszkowicz


Silvia Herszkowicz é psicanalista há mais de 10 anos e tem desenvolvido um trabalho com psicóticos tanto na análise individual como em grupo. Produzia o curta-metragem "O Diafragma da Alma", documentário vencedor do IV Prêmio Arthur Bispo do Rosário - CRP SP - Categoria vídeo, juntamente  com sua filha, cineasta Thais Herszkowicz. O Diafragma da Alma fala sobre o vazio interior sofrido pelos pacientes esquizofrênicos, vazio este representado no documentário como um único foco de luz ao chão, iluminando-os em um círculo vazio onde suas vidas são representadas por gestos, contos, olhares, desenhos e revelações. Silvia tem consultório na Rua Pamplona, São Paulo. Para entrar em contato, seu e-mail é angel8000@terra.com.br 
Para ver o vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=0znS2ZxrAQg (com legenda em espanhol)
 https://vimeo.com/33352291 (em HD)
https://vimeo.com/43633471  (com legenda em Inglês)


1- Silvia, conte-nos do seu caminho profissional na clínica de psicóticos, há quanto tempo trabalha com psicóticos e que tipo de trabalho desenvolve?

Comecei a trabalhar nesta área há 10 anos observando o Grupo Vida, coordenado pela Dra Araceli Albino, no Núcleo de Pesquisas Psicanaliticas na Vila Mariana.
No início de meu trabalho com o grupo anotava todos os diálogos entre pacientes e analistas, observando cada detalhe e o comportamento de todos. Após este período de observação me senti pronta para fazer parte deste grupo, trabalhando tanto individualmente quanto em grupo com esses pacientes.
O Grupo Vida segue até hoje como um grupo aberto para que os pacientes possam falar e serem ouvidos, não há a obrigatoriedade de falar. Os pacientes sentem-se a vontade para expor seus problemas, angústias, medos, vergonhas e ao mesmo tempo ouvem os problemas dos outros, o que eles dizem que lhes traz um certo conforto.
A Dra Araceli, que fundou o grupo, sempre fez também a função de conter os surtos que aconteciam com alguns pacientes através da direção de tratamento que foi criando um método próprio. Todos os pacientes além da terapia de grupo fazem também a terapia individual( na clinica social da entidade) bem como o tratamento com psiquiatras. Em grupo há um trabalho com arte terapia,, terapia corporal , teatro, música e tudo que possa colaborar para a melhora dos pacientes. Nada é obrigatório mas os resultados melhores vem sempre com a integração grupo/individual.

2- Freud acreditava não poder trabalhar analiticamente com pacientes psicóticos devido a ausência de transferência, mas graças a Lacan, sabemos hoje ser possível o trabalho clínico com o psicótico porque há transferência. Como você observa essa transferência na clínica e qual a qualidade desse tipo de transferência?

Na realidade para trabalhar com a psicose o analista tem que estar muito bem analisado para não se misturar com o conteúdo deste paciente que tem seu inconsciente a céu aberto e muitos analistas não aguentam esta situação porque este tipo de paciente é completamente imprevisível e se por um acaso ele surta, o psicanalista tem que dar conta deste surto, entrar no surto, sustentar sua posição, ajuda-lo a sair do surto e depois dirigi-lo para a realidade. Penso que se um analista de neuróticos tem AMOR DE ANALISTA no caso da psicose é muito mais AMOR DE ANALISTA.. É uma relação muito forte pois o paciente deposita toda a sua carga de delírios, alucinações e vários outros conteúdos em cima de seu analista e este analista tem que dar conta de tudo isto sem se misturar com este paciente e jamais demonstrar medo, pois se há medo da parte do analista o psicótico percebe , se aproveita disso e não acontece a transferência.

3- No seu ponto de vista, quais os pontos chaves na clínica da psicose para que o trabalho analítico possa ser desenvolvido?

Vontade do paciente, vontade e preparo do analista (tripé da psicanalise) para lidar com demandas tão fortes destes pacientes, paciência para atender esse paciente não somente em sessão, pois quando a transferência se faz ele vai requisitar muito e o analista tem que atender dando limites mesmo que ele não os siga.

4- E o analista, que tipo de atributos especiais deve desenvolver para praticar a clínica da psicose?

O analista tem que querer atender este tipo de paciente mas também tem que estar bem analisado para não misturar seus conteúdos com os dele e ter firmeza para enfrentar seus surtos, seus delírios, suas alucinações para coloca-lo na realidade. Há de ter a continência Winnicottiana e a firmeza Lacaniana.

5- Você acredita que a psicanálise venha a desenvolver novos recursos, considerando um aumento de números dessa psicopatologia, para futuramente lidar com a clínica da psicose de uma forma institucional e mais abrangente?

Sinceramente não. Acho que no Brasil,agora na contemporaneidade, a psicanalise ainda anda a passos lentos e por ser um processo muito longo e individual é para poucos, pois hoje as pessoas querem resultados imediatos, sendo neuróticos. Com a clínica da psicose o processo é muito mais demorado.

6- De que forma se maneja a metáfora delirante nessa clínica?

Entrando junto com o paciente nessa metáfora delirante, e com ele argumentar se aquilo pode acontecer na realidade ou não. O analista tem que perceber quais são as potencialidades do paciente e dirigi-lo para tais potencialidades e só assim será possível inseri-lo na sociedade.

7- Quais as principais diferenças do trabalho analítico com neuróticos e psicóticos?

Para os neuróticos o analista trabalha no contra ponto do problema já o psicótico não tem esse contra ponto, ele (psicótico) não consegue ir a lugar nenhum que seja útil para si sem a ajuda do analista.



Muito obrigado Silvia, pela participação no nosso blog.

2 comentários:

  1. Muito bom.. e muito interessante esse trabalho, Gostaria muito de conhecer mais afundo, pois tenho vontade de desenvolver trabalhos com esses pacientes quando estiver formado..

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